Autora: Anna Todd
Editora: Editorial Presença
Publicação: Março de 2019
Género: Romance
Nº de Páginas: 536
SINOPSE
«Tessa Young é uma jovem reservada e estável que sai de casa da mãe, uma mulher autoritária e preconceituosa, para iniciar os seus estudos na universidade, separando-se pela primeira vez do namorado de sempre, Noah, um rapaz doce e amoroso.
Logo no primeiro dia, conhece a sua companheira de quarto, Steph, e os amigos desta, entre os quais Hardin, um inglês insolente, cheio de tatuagens e piercings. Rápida e inesperadamente, Tessa e Hardin iniciam uma relação intensa mas atribulada, pois ele é um bad boy que só arranja problemas.
Tessa tem de tomar uma séria e dolorosa decisão: será que faz sentido trocar Noah por Hardin, desiludindo a sua superprotetora mãe e sabendo que a sua vida nunca mais será a mesma?»
Capa: ★★☆☆☆
Enredo: ★☆☆☆☆
Escrita: ★★☆☆☆
Personagens: ★★☆☆☆
Avaliação Final: ★★☆☆☆
Este livro dispensa apresentações. O sucesso de After tem dado que falar desde a sua primeira edição em Portugal, em 2015, e agora com a recente adaptação cinematográfica. Quando me informei mais sobre este livro fiquei reticente em lê-lo, não por ter começado por ser uma fanfic inspirada na mundialmente famosa ex-banda One Direction, mas pelos temas que a compõe e a forma como são tratados. Ainda assim (e mantendo o ceticismo, confesso), decidi pedir o primeiro livro emprestado a uma amiga e dar-lhe uma chance.
Para ser justa, vou começar por falar das coisas boas, porque sim, apesar de tudo este livro ainda teve alguns aspectos positivos. Um deles foi a escrita. Não foi nada muito por aí além. Simples, repetitiva e com demasiados detalhes irrelevantes (como é típico nas fanfics), mas tendo em conta o formato inicial e o público-alvo da história, acho que a autora conseguiu captar muito bem a montanha-russa de emoções que envolve o relacionamento de Tessa e Hardin. A narrativa foi criada a partir do ponto de vista de Tessa e foi muito fácil para mim visualizar-me na mente dela, não só pela eficiente construção de personagem, mas também pelo vocabulário emocional empregue.
Outra das características positivas desta obra foi a evolução da protagonista. Quando chego à última página de um livro gosto sempre de fazer um balanço das personagens, comparando quem eram no início com quem se tornaram no final. Personagens que se mantêm rasas perdem toda a credibilidade. Felizmente, não foi o caso de Tessa Young. Começou como o típico pãozinho sem sal; uma rapariga frágil e obcecada por controlar tudo, a habitual nerd destes clichês românticos, mas com o tempo, vimos desabrochar nela um lado mais descontraído, espontâneo e seguro de si.
«Apesar do caos que acabou de ocorrer no meu pequeno quarto, sinto-me calma. Tudo isto parece um sonho. Não deixo de pressentir que é a calma antes da tempestade, mas, neste preciso momento, o Hardin é a minha âncora. Apenas rezo para que ele não me puxe para o fundo.»
E agora, chegou a altura de falar sobre o elefante na sala.
Hardin é um jovem problemático e emocionalmente instável que acredita que a melhor forma de resolver os problemas é quebrando mobília e andando à pancada. É controlador, impulsivo, autoritário e extremamente grosseiro. Não tem qualquer tipo de apreço ou respeito pelas pessoas e está sempre à espera que as coisas corram como ele quer. Um conjunto de características que se esperava ser incapaz de cativar qualquer pessoa com o mínimo de discernimento, no entanto, a autora consegue descrevê-lo de uma forma que o faz parecer a coisa mais irresistível do mundo, cobrindo-o de uma intuitiva aura de mistério e aventura que já é habitual nos bad boys da literatura pop. E claro, como já é da praxe, as suas atitudes tornam-se justificáveis a partir do momento em que ficamos a conhecer o seu passado obscuro.
50 Sombras de Mais do Mesmo.
A relação de Tessa e Hardin é cheia de altos e baixos, por assim dizer. Ao início nenhum quer. Depois já querem. Depois o Hardin muda de ideias. Depois já quer outra vez. Mas depois volta a não querer. E a seguir já quer, mas dura apenas o suficiente até voltar a não querer. E no meio disto tudo, há ciúmes descontrolados, discussões, sexo, móveis partidos, lutas, sexo, gritos, jogos de verdade ou consequência, pedidos de desculpa, sexo, uns quantos momentos carinhosos e, ah, já disse sexo?
Quase que mascara o facto de isto ser a descrição perfeita de um relacionamento tóxico.
Quase.
«— Não percebo porque é que gostas tanto de jogar ao gato e ao rato comigo. És simpático mas no momento a seguir tornas-te mau. Dizes à Steph que «acabas comigo» se eu me aproximar de ti, pouco depois dás-me boleia para casa. Não estás bom da cabeça.»
Esta história é má. Mas não é por ser o apogeu dos clichês românticos. Não é por ter um enredo repetitivo que se resume a um looping infinito de discussões e reconciliações. Não é porque Hardin não presta. Não é porque Tessa é complacente com as atitudes violentas de Hardin. Nem sequer é por o relacionamento deles ser abusivo. É por tudo isto ser vendido como um ideal de amor. Porque a vida real é aborrecida e as pessoas (sobretudo os jovens) procuram alguém que as incendeie. E é isto que After oferece, um vislumbre do que poderia ser a nossa história de amor se ao menos fossemos capazes de encontrar o nosso Hardin. Porque quantas de nós já não fomos a Tessa? Quantas vezes não nos perdemos dentro dos nossos romances de cabeceira, sonhando acordadas com o misterioso galã que aparece e vira a nossa vida do avesso? Existem muitas Tessas por aí. O problema é que também existem muitos Hardins. E geralmente só nos apercebemos disso depois de mais uma mulher aparecer morta no contexto do que tão popularmente chamamos de violência doméstica.
Este tipo de literatura acaba por ser um veículo de convicções inconscientes sobre relacionamentos afectivos. Jovens por todo o mundo são ensinadas que devem consentir atitudes agressivas dos seus namorados porque, coitadinhos, têm traumas de infância. Aprendem que ciúmes e discussões constantes são normais e que quando se ama não se deve desistir, porque existe a chance, ainda que longínqua e remota, de que um dia eles possam mudar. É assim que se normaliza comportamento abusivo. É assim que se contribui para a cultura da romantização da violência conjugal.
É assim que começa.
E já todos sabemos como acaba.
3 Comentários
Thata
27 de Outubro, 2020 at 1:04Amei tudo o que disse e concordo. Vi muita gente romantizando o relacionamento deles. Fiquei impressionada com isso e vim procurar opiniões que eu concorde. Eu estou lendo movida pela raiva que tenho por Hardin ser um babaca e Tessa aceitar.
Elga Fontes
28 de Outubro, 2020 at 15:51É verdade! Eu não costumo dizer que um livro é bom ou mau porque o máximo que eu posso dar é a minha opinião, mas este aqui é o único para o qual eu abro uma excepção por todas as ideias erradas e tóxicas que defende
Catarina
11 de Julho, 2022 at 19:38É isto mesmo. Sem tirar nem pôr.